Data: 10 de junho
O Ministério Público do Trabalho (MPT) em São Paulo realizou ontem (9/6) audiência pública com cerca de 50 empresas para alertar sobre a exposição ao amianto de trabalhadores do setor de comércio. O amianto é uma substância reconhecida como cancerígena pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e que continua sendo vendida apesar de proibições em diversos estados brasileiros.
Com o tema “Obrigações legais das empresas que comercializam e utilizam produtos com amianto e consequências previstas em lei”, a audiência aconteceu na Assembleia Legislativa de São Paulo e teve palestra de representantes do MPT e de especialistas em saúde do trabalhador e representantes da sociedade civil, como a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto – Abrea. O debate foi aberto pelo deputado estadual Marcos Martins, responsável pela lei 12684/2007, que baniu o uso do amianto no estado de São Paulo, e mediado pelo procurador do Trabalho Patrick maia Merísio (MPT-SP).
“O amianto é uma das principais causas de câncer ocupacional no mundo, de diagnóstico difícil”, afirmou a procuradora do Trabalho Márcia Aliaga (MPT-SC), que junto com o procurador Luciano Leivas (MPT-SC) representou o Programa Nacional pelo Banimento do Amianto do MPT. “Porque o banimento? Não existe limite seguro para a exposição a essa substância. Muitos países, como Chile e Argentina, já baniram”, afirmou. No Brasil o amianto foi banido em 7 estados, inclusive em São Paulo, mas a lei federal que o proibiria em todo o país ainda aguarda aprovação.
Um dos grandes problemas enfrentados atualmente é que o amianto ainda é comercializado no país, apesar de haver poucos produtores. “A comercialização é ilícita”, afirmou Luciano. “Já são disponibilizados produtos sem amianto, e os distribuidores já podem optar por eles no estado de São Paulo”, completa. Os procuradores ressaltaram que quem usar ou comercializar a substância deve encaminhar ao MPT ou aos órgãos de vigilância sanitária e saúde uma listagem dos trabalhadores que foram expostos, para acompanhamento pelo Sistema único de Saúde, pois podem estar contaminados.
Outra questão é a eliminação dos resíduos ainda presentes. “A própria Eternit, quando foi demolida, deixou escombros repletos de amianto, e foi necessário embargar a obra para evitar a contaminação”, afirmou Fernanda Giannasi, Engenheira Civil especializada em Engenharia e Segurança do Trabalho, famosa pelo ativismo contra o amianto. Segundo ele, os resíduos devem ser descartados em aterros sanitários classe 1 por empresas especializada no manuseio.
Para Ubiratan de Paula Santos, especialista da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, “depois do tabaco, o amianto é a substância que causa maior diversidade de doenças na espécie humana”, como fibrose e câncer de pulmão, câncer de laringe, ovário e testículos, além de mesotelioma e derrame pleural. “Nosso organismo não tem meios apropriados de defesa contra essa substância”, alerta, ressaltando que “quem mora perto de ambientes de rejeito ou fabrico está próximo o suficiente para desenvolver a doença”.
As especialistas Simone Alves do Santos, diretora da Divisão Técnica de Vigilância Sanitária do Trabalho – Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (DVST-CEREST), e Adriana Cardoso, gerente de Vigilância em Saúde do Trabalhador da Coordenação de Vigilância em Saúde (COVISA) apresentaram um levantamento de ações de seus respectivos órgãos no combate ao uso e distribuição do amianto. “Entre 2012 e 2015 160 mil produtos foram interditados em 6767 estabelecimentos no estado de SP”, afirmou Simone. Adriana ressaltou que na cidade de São Paulo não há mais produção de material com amianto, “então resolvemos atuar na comercialização”, inspecionando mesmo empresas que afirmaram, em enquete oficial, não vender mais a substância.
Depoimentos
Na audiência foram ouvidos fortes depoimentos de pessoas que adoeceram seriamente em função da exposição à substância, alguns em uma época em que os efeitos ainda não eram conhecidos. “Não sabíamos que éramos vítimas. Trabalhei 25 anos na Eternit, e foi a Abrea que me encaminhou para exames na Fundacentro”, afirmou Eliézer João de Souza, presidente da Abrea. A Eternit só encaminhou Eliézer para exames após 18 anos de exposição constate.
“Amianto é uma tecnologia da morte”, afirma José Carlos Manzine. “No planeta temos 125 milhões de pessoas expostas, ainda, e 107 mil morrem por ano”, concluiu, emocionado.
Contaminação
O amianto, ou asbesto, é o nome comercial dado a um conjunto de minerais fibrosos utilizados em mais de 3 mil produtos industriais, sendo que o mais conhecido é a telha de fibrocimento ondulada. Segundo a OMS, nenhum dos diversos tipos de amianto é seguro para uso humano, e diversos países já baniram seu uso e produção. No Brasil a substância é oficialmente reconhecida como altamente cancerígena, mas, apesar disso, o amianto é proibido somente em oito estados brasileiros (SP, RJ, RS, MS, MT, PA, PE e MG). O projeto de lei federal que visa a proibir a produção e comercialização do amianto no país demora a ser aprovado por motivos comerciais: o Brasil é um dos cinco maiores produtores do mundo.
Eternit
Em 2013 o MPT em São Paulo ingressou com a ACP em favor da coletividade e de ex-empregados da fábrica em Osasco/SP, que morreram ou sofrem graves doenças respiratórias e câncer de pulmão relacionadas ao amianto. Como resultado, em 2016 a justiça condenou a Eternit ao pagamento de R$ 100 milhões em indenização por danos morais coletivos.
Ao longo de 52 anos a Eternit manteve a planta industrial de Osasco funcionando, mesmo sabendo das trágicas consequências no uso do amianto, pondo em risco mais de 10 mil trabalhadores. A empresa foi condenada também a oferecer tratamento de saúde integral e vitalício a todos os ex-empregados e familiares expostos ao amianto durante as atividades da unidade.
Segundo o MPT, numa amostra de mil ex-trabalhadores, avaliados pela Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Medicina e Segurança do Trabalho – Fundacentro, quase 300 adoeceram por contaminação do amianto. Destes, 90 morreram entre 2000 e 2013, mas o número pode ser muito maior, já que a Eternit ocultou ou dificultou a ocorrência de inúmeros registros.
(Fonte: MPT/São Paulo)