Atuação da fiscalização resolve casos de trabalho escravo no ato, diz auditora

Atuação da fiscalização resolve casos de trabalho escravo no ato, diz auditora

Data: 28 de janeiro

De acordo com a auditora fiscal do Trabalho Márcia Albernaz, coordenadora do projeto de Combate a Condições Análogas à Escravidão, da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Rio de Janeiro (SRTE/RJ), para ampliar o combate ao trabalho escravo no Brasil, é preciso aumentar o contingente de auditores fiscais do trabalho por meio de concurso público. Ela disse que a atuação da fiscalização é imediata, porque resolve a situação no ato. “Em uma situação de gravidade, como é essa de exploração, é crucial que tenha mais agentes públicos diretamente relacionados a esses casos”.

O Rio de Janeiro ocupou o terceiro lugar no ranking de trabalhadores escravos resgatados pelo Ministério do Trabalho no Brasil em 2015, divulgado hoje. No país foram resgatados 1.010 pessoa, segundo balanço do ministério divulgado para marcar o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, lembrado hoje (28).

História

Márcia disse que, no passado, quando se pensava em trabalho escravo, isso remetia quase integralmente ao trabalhador rural. Somente a partir de 2009 houve uma intensificação da fiscalização no combate ao trabalho escravo urbano. Márcia lembrou que a primeira denúncia contra o trabalho escravo no Brasil foi feita pelo bispo Dom Pedro de Casaldáliga, em 1970, envolvendo trabalhadores que estavam sendo explorados no interior do Mato Grosso. Em 1995, foi montada a primeira equipe multidisciplinar para combater essa prática.

“Com o tempo, a gente observou, no dia a dia, que se deveria imputar responsabilidades àqueles que eram os maiores beneficiários econômicos da exploração. Porque, muitas vezes, em uma atividade tipicamente rural, como a produção de carvão vegetal, o maior beneficiário não é o fazendeiro, nem o carvoejador, mas aquele que transporta e aquele que compra na siderúrgica para fazer beneficiamento”. Foi quando começou, juridicamente, a se construir a tese da cadeia produtiva. Essa tese diz que muito embora à distância, a responsabilidade seria do beneficiário final porque aquele insumo estaria inserido dentro da atividade matricial, princípio portanto daquele empreendimento, disse a auditora fiscal.

Quando essa tese ganhou corpo, começou-se então a aplicar a responsabilização por meio da verificação de terceirizações irregulares em diversos segmentos, como o setor de confecções, na área urbana, onde costureiras eram exploradas, com jornada de trabalho abusiva, em decorrência das várias camadas estruturais do produto. “é uma forma de você mascarar o verdadeiro empregador, que aparentemente é aquele pequeno [empresário], mas para o operador do direito, que tem um olhar mais aguçado, o verdadeiro tomador é o beneficiário último da cadeia”, disse Márcia. Segundo ela, é esse que está tendo o grande lucro e não se preocupa com a forma com que a produção ocorre.

Imigrantes

No caso de imigrantes, Márcia acentuou que se trata de mão de obra vulnerável, porque tem distanciamento geográfico dos parentes e, por força disso, está em situação de vulnerabilidade econômica. “é fácil explorar e pagar qualquer coisa para esse imigrante que não tem outro recurso, nem outra possibilidade. De modo que a gente diz que essa não é uma escravidão da liberdade ambulatória, mas é uma escravidão que mexe com a capacidade de autodeterminação do sujeito que está sendo explorado”.

O imigrante é obrigado a praticar jornadas exaustivas que mexem com o lado psíquico e a estrutura física do trabalhador. “é uma dupla exploração. E ele, literalmente, por vezes, dorme e acorda dentro do ambiente do trabalho”. O Artigo 149 do Código Penal inclui quatro elementos típicos do trabalho escravo, que são trabalho forçado, jornada exaustiva, degradância e servidão por dívida. Outros três elementos não mexem com a liberdade de ir e vir, mas com a capacidade de autodeterminação, que abrange a retenção de documentos, a retenção de objetos pessoais e qualquer prática que reduza a liberdade de locomoção.

“A servidão por dívida é uma forma de mexer também na capacidade de ir e vir do indivíduo”. Nesse tipo de escravidão, o ordenamento jurídico brasileiro consagrou que o mais relevante é a dignidade do trabalhador. Por isso, o crime previsto no Artigo 149 caracteriza o trabalho escravo por mexer com a dignidade do indivíduo, além da locomoção.

Igualdade

Em 1988, a lei brasileira estabeleceu igualdade formal entre trabalhadores urbanos e rurais. Na prática, porém, Márcia disse que a legislação que regulamenta a força de trabalho dos rurais está fora da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). “é uma legislação esparsa”. Há, manifestou, uma facilitação desse tipo de exploração que é “extremamente lucrativa”. Ela reforçou que se trata de um crime de conteúdo econômico. “Ninguém faz isso porque é bom ou porque é mau, mas sim porque dá lucro”.

Os trabalhadores vulneráveis à exploração são, na avaliação da auditora do trabalho, os imigrantes estrangeiros e os migrantes nacionais, que saem de estados onde a oferta de trabalho é menor em busca de novas oportunidades. “Eu diria que a exploração de mão de obra hoje não está ligada só à falta de cultura do trabalhador”. Com a caracterização de inúmeros casos no âmbito do trabalho urbano, verifica-se que há trabalhadores com nível de educação universitária, falando às vezes vários idiomas, e que são explorados.

Márcia diz que, na medida, em que se investe em educação no longo prazo, o país deslancha. Se houver um salto tecnológico, isso faz com que as oportunidades de emprego no país sejam maiores, com isso, as explorações se reduzem, ”é uma questão de oferta e de procura”.

(Fonte: Agência Brasil)

Por |2016-01-29T17:50:56-02:0029 de janeiro de 2016|Notícias|