Data: 4 de novembro
A Usina Açucareira São Manuel S/A, associada à maior comercializadora de açúcar e etanol do país (Copersucar S.A), foi condenada a adotar medidas para prevenir acidentes que decorrem da exposição de cortadores de cana ao calor. A decisão é resultado de ação civil pública do Ministério Público do Trabalho (MPT) em Bauru (SP). As adequações devem ser implementadas no prazo de 90 dias, a contar da data da sentença, dada em 22 de setembro, sob pena de multa R$ 1 mil. Cabe recurso ao Tribunal Regional do Trabalho de Campinas.
A empresa começou a ser investigada em 2010 pelo procurador Rogério Rodrigues de Freitas, que verificava a adequação da usina ao Programa Nacional de Erradicação de Irregularidades no Setor Sucroalcooleiro, elaborado pelo próprio MPT. Frente às irregularidades, o procurador chegou a propor a celebração de um termo de ajuste de conduta (TAC), na tentativa de solucionar a questão extrajudicialmente com a empresa, que não demonstrou interesse em assinar o acordo.
Em sua decisão, o juiz Carlos Roberto Ferraz de Oliveira Silva, da Vara do Trabalho de Botucatu (SP), julgou parcialmente procedentes os pedidos do MPT e ainda ressaltou que, por causar risco à saúde e até à vida do trabalhador, o trabalho rural não pode ser enfrentado somente com o pagamento do adicional de insalubridade.
Para o magistrado, uma vez identificado o risco por exposição ao calor e não sendo possível eliminá-lo, é dever do empregador efetuar controle rigoroso desse risco. “A obrigação do empregado na defesa do meio ambiente salubre tem seu fundamento não só no inciso VI da Constituição da República, mas também na Norma Regulamentadora nº31, que, dentre outras responsabilidades, obriga o empregador rural a identificar e, sucessivamente, eliminar, controlar ou reduzir ao mínimo os riscos decorrentes do trabalho”.
Obrigações – A sentença obriga a Usina São Manoel a monitorar durante toda a jornada de trabalho a exposição dos seus trabalhadores ao calor, determinando a suspensão imediata das atividades sempre que a temperatura atingir 35,9ºC, se medida com termômetro normal, ou se atingir o valor equivalente a 25 IBUTG*, se medida com o aparelho apto a demonstrar tal índice. Nessa situação, os trabalhadores devem permanecer à disposição da usina até o final da jornada ou até a diminuição da temperatura.
Além disso, a usina deve implementar pausas para descanso nos horários de maior concentração de calor e observar rigorosamente medidas como, realizar, com periodicidade quadrimestral, exame médico nos trabalhadores que se ativam na atividade de corte manual de cana de açúcar, para a detecção precoce dos distúrbios musculoesqueléticos e decorrentes de excesso de esforço no desempenho da atividade.
Calor – Um estudo apresentado pela Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep) faz analogia do corte de cana com a maratona, sendo que ambas as atividades geram praticamente o mesmo nível de desgaste físico. A pesquisa apresenta números que dão a dimensão do enorme esforço realizado pelos cortadores durante a jornada de apenas um dia: eles desferem uma média de 3.792 golpes com o podão, realizam 3.394 flexões de coluna e levantam cerca de 11,5 toneladas de cana.
Literaturas e artigos técnicos afirmam que quando a necessidade de regulação da temperatura corporal aumenta, o sistema cardiovascular pode tornar-se sobrecarregado durante o exercício no calor, já que deve transferir alta taxa de fluxo sanguíneo para a área entre a pele e os músculos, deixando as demais com pouca oxigenação. A consequência pode ser fatal: infartos e acidentes cardiovasculares podem acontecer durante a “maratona”. Além disso, sintomas de fadiga, como tontura e vômitos, e cãibras pela desidratação, podem ser comuns. No corte de cana, ao menos 21 mortes por exaustão já foram contabilizadas no interior paulista desde 2004.
Fonte: Revista Proteção