Data: 06 de janeiro
Pleito por melhores condições de trabalho alcança grande impacto e visibilidade
Num oportuno surto de bom senso, jogadores e torcedores de todos os “bichos” – urubu, galo, peixe, leão, raposa, coelho, macaca, tigre, jacaré e porco, entre outros – e de todas as “cores” – alvinegro, rubro-negro, tricolor, verde, azul, grená, tricolor, colorado, e outras – estão se unindo em torno de um novo time de futebol: o “Bom Senso F.C.”. Ou melhor, este novo clube de futebol, nem é um clube – no sentido de ser fechado – e nem se limita ao futebol, tendo entrado em campo, desfraldando a bandeira da luta por melhores condições de trabalho para os atletas profissionais, mas também para todos os trabalhadores que fazem parte da “cadeia produtiva” do esporte: técnicos, roupeiros, médicos, massagistas, “radialistas” da televisão e do rádio, e outros trabalhadores invisíveis e inaudíveis…
Que características este movimento tem, capazes de levar este analista (santista) de rotulá-lo como fato portador de futuro, no campo da SST? Como temos repetido, o conceito desta expressão foi enunciado por Michel Godet, como: “sinais ínfimos, por sua dimensão presente, existentes no ambiente, mas imensos por suas consequências e potencialidades”.
Com efeito, o movimento criado por atletas de futebol – Paulo André, Alex, Juninho Pernambucano, Seedorf, Edu Dracena, Fred, Elias, entre outros – nos estimula a, em primeiro lugar, saudá-lo, pois raramente se vê atletas profissionais “vestindo a camisa” da luta por melhores condições de trabalho, com tanta capacidade de articulação, tanta consciência, tanta criatividade e tanta coragem e ousadia, pois não lhes tem faltado o contra movimento da desqualificação, da ridicularização, das pressões e das ameaças. “As ameaças de punição não vão nos deter”, garante o líder do movimento, zagueiro Paulo André Cren Benini, em recente entrevista à revista Veja. “Aceitamos desafiar os poderosos, mas não desmoralizar o futebol”, completa o jogador.
Capacidade de articulação é condição essencial para qualquer movimento social. Nas articulações do Bom Senso F.C. cerca de 150 jogadores de futebol trocam mensagens pelo WhatsApp, com uma média de 200 mensagens diárias. As lideranças são constituídas por jogadores “sêniores”, quase todos com vivência europeia e em grandes clubes. Isso lhes assegura uma relativa imunidade contra as pressões, ao mesmo tempo em que os coloca como referência para os mais jovens e mais vulneráveis.
Criatividade e ousadia não lhes têm faltado. Em mensagem disparada pelo Twitter, logo após um jogo entre Vasco e Cruzeiro, recentemente realizado no Maracanã, o movimento informou: “já alertamos com um abraço, já cruzamos os braços por um minuto, e agora sentamos para esperar a resposta da CBF”. Na partida entre São Paulo e Flamengo, na 34ª;; rodada do “Brasileirão”, o árbitro Alício Pena Júnior ameaçou aplicar cartão amarelo em todos os jogadores, caso resolvessem retardar o início do jogo. Foi então que os jogadores tiveram a ideia de “tocarem” a bola de lado, mas parados.
Grande têm sido a visibilidade e o impacto, primeiro, entre os milhares que afluem aos estádios; segundo, entre os milhões de telespectadores. A pauta de pleitos inclui a revisão do calendário nacional de futebol, férias para os atletas e período adequado de pré-temporada, entre outros itens. “Desde os 20 anos, toda sexta, sábado e domingo estou concentrado ou jogando. Desde que sou atleta, não viajo no fim de semana, não sei o que é feriado, não sei o que são dois dias de folga seguidos”, dispara Paulo André. Para ele, o trabalhador “comum” tem 52 fins de semana, ou seja, mais de 100 dias, e os jogadores de futebol têm apenas 20 dias de folga ao ano.
Ao finalizar, saudamos este movimento, por haver priorizado a questão das condições de trabalho (organização do tempo de trabalho, entre outras). E que nasçam movimentos similares, de outros segmentos de trabalhadores e trabalhadoras – como os “viajantes e expatriados”, por exemplo – talvez menos visíveis, menos articulados, menos “empoderados”, por isso, mais vulneráveis a pressões e ameaças. Também é fato portador de futuro, que a questão das condições e ambientes de trabalho não é apenas técnica, normativa ou “legal”, antes, política, social e coletiva! Que as lições do movimento Bom Senso F.C. extrapolem os campos de futebol e os aparelhos de televisão, ajudando a alavancar movimentos sociais em prol da melhoria das condições e ambientes de trabalho, de todos os trabalhadores! é uma questão de bom senso, e de equidade!