Data: 11 de setembro
Fiscais do Ministério do Trabalho encontraram 26 trabalhadores em condições semelhantes às de escravos em uma colheita de tomates na cidade de Pirassununga, no interior de São Paulo.
No Sítio São José, o produtor de tomates Shigueo Hayata empregava famílias vindas das cidades de Taiobeiras e Salinas, de Minas Gerais. Segundo depoimentos dos trabalhadores, o próprio empregador encomendava a vinda dos migrantes ao interior de São Paulo, que chegaram de ônibus fretados. Segundo o Ministério Público, isso pode configurar aliciamento de mão de obra, crime previsto no Código Penal.
Ao chegarem ao local da colheita, as famílias foram alojadas em moradias precárias, feitas de material compensado produzido com caixas recicladas de leite. As famílias, compostas por duas ou mais pessoas, se aglomeravam no alojamento improvisado. Havia crianças no local.
As instalações não atendiam às determinações impostas pelo Ministério do Trabalho. A fossa séptica ficava a seis metros da moradia, quando o espaçamento determinado pelas normas deve ser de, no mínimo, 30 metros. Havia vazamento e a tampa da estrutura estava ruindo.
Trabalhavam na plantação de tomate pessoas sem registro em carteira de trabalho. Segundo o Ministério do Trabalho, a família Hayata mantinha as carteiras retidas no Sindicato dos Produtores Rurais de Pirassununga, um dos fatores determinantes para o enquadramento na situação de trabalho degradante.
O procurador Nei Messias Vieira relatou que os trabalhadores não recebiam salários e recebiam falsas promessas para que ficassem na propriedade até o final da safra.
Segundo depoimentos, entre eles do encarregado da lavoura, foi prometido o pagamento, ao final da colheita, de valores que poderiam atingir R$ 15 mil por pessoa, na forma de participação nos lucros. Enquanto a promessa não se concretizava, cada família recebia um valor mensal pré-determinado em cheque, na forma de adiantamento, que era descontado em um pequeno mercado da cidade. Eles trocavam o valor integral do cheque por mercadorias. Por isso, não havia qualquer sobra a ser revertida para o pagamento salarial. Procuradores e fiscais identificaram que essa prática vinha ocorrendo há pelo menos cinco meses.
Nas frentes de trabalho, as autoridades apontaram risco de contaminação na aplicação de agrotóxicos, já que o uniforme utilizado para a atividade é higienizado em meio à lavoura, quando deveria ter um local apropriado para a lavagem. As máscaras de proteção, que não podem ficar próximas ao uniforme com veneno, são lavadas junto com o restante do equipamento.
Os 26 trabalhadores resgatados pelo Ministério do Trabalho vão receber as verbas referentes à rescisão contratual (FGTS, multa, 13º salário, férias, etc) e também a guia para a retirada do seguro desemprego. Eles voltaram, nessa terça-feira (11), para as cidades de origem, em Minas Gerais. Hayata se comprometeu a providenciar ônibus e bancar outros gastos da viagem.
O produtor rural firmou TAC (termo de ajustamento de conduta) se responsabilizando pelo pagamento de aproximadamente R$ 15 mil líquido para cada trabalhador, sendo R$ 5 mil de indenização por danos morais e R$ 10 mil referentes às verbas rescisórias. Os “mensalistas” receberão R$ 3 mil líquidos pela remuneração prevista e mais R$ 1.500 por cada mês ou fração inferior a 15 dias pelos danos morais sofridos.
Outras propriedades
Outras fazendas foram vistoriadas durante a operação, nas cidades de Conchal e águas de Lindóia. Em ambas, foram encontrados problemas de falta de segurança na aplicação de pesticidas agrícolas.
Em Conchal, no Sítio São José, de propriedade de Hélio Hayata (filho de Shigueo Hayata), um tratorista era obrigado a respirar agrotóxico enquanto fazia a borrifação.
Ao caminhar pela plantação, com 150 mil pés de tomate, foi constatada a enorme quantidade de agrotóxicos despendida nos pomares.
Na propriedade, os trabalhadores estavam sem registro em carteira de trabalho. Algumas pessoas foram flagradas sem equipamentos de proteção. Nenhum dos colhedores disse ter feito exame médico admissional. Os sanitários, apesar de terem sido instalados da forma como prevê a lei, estavam muito distantes das frentes de trabalho
Já em águas de Lindóia, na Fazenda São João, o agrotóxico er aplicado sem qualquer treinamento pelos trabalhadores que fazem a colheita e a chamada “amarração” dos pés de tomate. A mão de uma trabalhadora estava tomada por defensivos agrícolas no momento da fiscalização.
Especialistas e médicos do trabalho alertam que esse tipo de substância chega à corrente sanguínea com certa facilidade por meio do contato com a pele, que a absorve para dentro do organismo.
Todos os trabalhadores que deram depoimento ao Ministério Público disseram que levam as roupas com agrotóxicos para serem lavadas em suas casas.
Os auditores encontraram um menor com 16 anos de idade colhendo tomates. Para esse tipo de atividade, a lei autoriza o trabalho apenas ao completar a maioridade. Filhos de colhedores também foram vistos em meio à colheita. Mesmo sem trabalhar, eles ficam expostos aos riscos de contaminação por agrotóxicos.
Cerca de quatro casas foram arrendadas pelo produtor de tomate de águas de Lindóia para abrigar as famílias que chegavam de Ribeirão Branco, região do Vale do Ribeira, para trabalhar na colheita.
Uma das moradias estava com sérios problemas estruturais, com uma das vigas desmoronando. Nos fundos da mesma casa, o esgoto corria a céu aberto, trazendo riscos à saúde dos moradores.
O proprietário da lavoura em águas de Lindóia assinou TAC se comprometendo a regularizar todos os problemas levantados pela fiscalização. Ao todo, são 28 obrigações assumidas perante o Ministério Público que, se descumpridas, devem gerar multa.
Fonte: R7