Data: 11/01/2011
Estudo inédito da Secretaria Estadual da Saúde sobre as condições de trabalho dos cortadores nas lavouras de cana-de-açúcar do Estado de São Paulo, maior produtor mundial do produto, aponta uma rotina de trabalho repetitiva e exaustiva.
Segundo os dados, a colheita é feita manualmente na maioria dos locais. Em média, por minuto, os trabalhadores fazem 17 flexões de tronco e aplicam 54 golpes de facão, mantendo uma postura incorreta. Por dia, eles perdem cerca de oito litros de água para cortar, em média, 12 toneladas de cana, e percorrer quase nove quilômetros.
“O setor sucroalcooleiro apresenta grandes contrastes em sua cadeia produtiva”, declara. “Apesar de ser uma indústria altamente lucrativa, as condições de trabalho ainda são, geralmente, de qualidade ruim, colocando em risco a saúde dos trabalhadores”.
Além de detectar ausência de sombras nos canaviais, o estudo revela que os cortadores de cana não se hidratam de forma adequada. Em geral, os trabalhadores levam de casa a água para consumir na lavoura e reabastecem os recipientes nos reservatórios dos ônibus, quando isso é possível.
“Esses reservatórios não são refrigerados e apresentam péssimas condições de armazenamento e higiene. A água fornecida não vem de fontes tratadas em 40% dos casos e, por isso, nem sempre atende aos requisitos de potabilidade”, diz.
Os dados indicam ainda que os cortadores não têm local adequado para realizar suas refeições e acondicionar alimentos. “Enquanto trabalham, os cortadores carregam consigo suas marmitas. Muitas vezes, o alimento fermenta ou azeda. Porém, como o trabalho consome muita energia, eles acabam consumindo a comida mesmo que esteja estragada”, afirma.
O levantamento, feito com base em inspeções coordenadas pela Vigilância Sanitária Estadual, irá nortear regulamentação estadual neste ano para melhorar as condições sanitárias no trabalho dos profissionais do setor.
“A Vigilância Sanitária está olhando para esse setor e discutindo políticas de saúde. O empregador tem que saber que está sendo vigiado”, pontua Maria Cristina Megid, diretora da Vigilância Sanitária Estadual.
Desde 2007, a Secretaria capacitou 500 profissionais de todo o estado para fazer a fiscalização desse setor. Nesse período, foram inspecionadas 148 usinas e feitas 102 autuações. Hoje, o Estado possui normatização para condições sanitárias dos alojamentos onde ficam os canavieiros. A fiscalização é feita em parceria com as vigilâncias sanitárias municipais.
Melhores condições
Na opinião do procurador do trabalho Luiz Henrique Rafael, as condições de trabalho dos cortadores de cana melhoraram nos últimos cinco anos. “A Secretaria da Saúde do Estado só passou a monitorar e fazer esse levantamento depois que o Ministério Público do Trabalho começou a apurar isso em 2005, 2006”, conta.
“Hoje, houve uma melhoria muito grande na região central do Estado, onde atua a procuradoria, a partir do momento em que nós começamos a atuar em conjunto com a Vigilância Sanitária e o Ministério do Trabalho e começamos a colocar as pausas no meio do trabalho, exigir fornecimento de soro fisiológico, fornecimento de água potável”.
De acordo com Rafael, há algum tempo atrás, muitos cortadores morriam nas lavouras em decorrência de exaustão e maus súbitos. Hoje, punições aplicadas a praticamente todas as usinas de cana-de-açúcar da região central do Estado garantem que direitos dos trabalhadores, como descanso semanal, alojamento, transporte, pausas durante a jornada e oferta de água potável e local adequado para as refeições sejam cumpridos.
Aperto na fiscalização
O gerente regional do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em Bauru, José Eduardo Rubo, responsável por fiscalizar 61 municípios, revela que, de janeiro a novembro de 2010, fiscais do órgão realizaram 146 ações fiscais na zona rural e lavraram 458 autos de infração, a maioria em regiões onde se concentram as grandes usinas de cana-de-açúcar da região.
Destes autos, 319 referem-se à área de segurança e saúde do trabalho e 139 ao setor de proteção ao trabalho, que trata de assuntos como registro, jornada de trabalho e FGTS. As infrações mais frequentes referem-se a questões envolvendo refeitórios, uso de equipamentos de proteção individual (EPIs), excesso de jornada e salários.
O gerente regional do MTE acredita que as condições de trabalho dos cortadores de cana oscilam em função da frequência da fiscalização. “Infelizmente, são proporcionais à ação fiscal”, declara. “O que a gente tem observado é isso: conforme a fiscalização aperta, o ambiente se mantém e melhora muito pouco. Se afrouxa, ele piora. Nunca melhora sozinho”.
De acordo com ele, no ano passado, o Ministério do Trabalho apertou a fiscalização com a vinda de cinco novos auditores, o que fez com que o número de autos de infração lavrados também aumentasse. Contudo, isso não teria resultado em uma melhoria na situação dos trabalhadores, definida por ele como estável.
“A melhora no ambiente de trabalho não foi significativa. Não verificamos grandes progressos”, diz. “A situação em que o trabalhador, principalmente do corte da cana, se encontra hoje é a mesma que vem há pelo menos três ou quatro anos. Essa realidade não mudou”.
Fonte: Jornal da Cidade de Bauru