O Porto de Santos, no litoral de São Paulo, abriga mais de 4.200 estivadores. O trabalho realizado por esta categoria no cais santista foi objeto de estudo de Thiago Pereira de Barros, mestre em Geografia pela Faculdade de Ciências e Tecnologia da Unesp de Presidente Prudente. A pesquisa teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Barros acredita que o sistema portuário nacional apresenta uma complexidade, “no que tange a sua dinâmica e funcionalidade”, que implica diretamente nos trabalhadores portuários. Segundo dados do Dieese, no ano de 2013 o Brasil registrava 15.820 estivadores.
A pesquisa tomou como recorte o processo de modernização dos portos brasileiros, de forma específica com relação aos estivadores que atuam no Porto de Santos, entre os anos de 1980 até os dias atuais.
Ele buscou dados documentais e bibliográficos que tratavam das consequências destes trabalhadores e entrevistou estivadores, lideranças sindicais e representantes portuários da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) e da Secretaria de Assuntos Portuários do município de Santos, entre outros.
“Também presenciei a cerimônia de passagem dos estivadores cadastrados para o registro, conheci alguns pontos de escalação ao trabalho e entrei algumas vezes no Porto de Santos”, o que possibilitou o estudioso a compreender as particularidades que envolvem o trabalho no Porto, em especial aos assuntos relacionados aos estivadores.
Durante seus estudos, Barros participou ainda de um intercâmbio no exterior, na Universidade Nacional da Colômbia, onde teve contato com trabalhadores portuários da América Latina e com as dificuldades impostas para estes trabalhadores frente ao processo de modernização dos portos.
Precarização do trabalho
Em seu estudo, o pesquisador fala sobre os tipos de transformações que ocorreram na questão da gestão, produção e controle do trabalho portuário.
Na gestão portuária, Barros identifica que o planejamento e a política setorial estão envolvidas atualmente com uma diversidade de instituições que “atuam e interferem na dinâmica do setor portuário”. São elas: Ministério da Saúde (por meio da Anvisa e da Autoridade Sanitária), Ministério da Defesa (Marinha e a Autoridade Marítima), Ministério dos Transportes (Antaq, Secretaria Especial dos Portos e Conselho de Autoridade Portuária), Ministério da Fazenda (Receita Federal e Autoridade Aduaneira), Ministério do Meio Ambiente (Ibama, Autoridade Ambiental) e a Autoridade Portuária.
Ele explica que com a Lei 8.630/1993 o modelo de organização dos portos adotado no país foi o landlord port, que significa que “a propriedade da terra e os investimentos em infraestrutura são de responsabilidade do setor público”, porém a operação portuária, é realizada pela esfera privada. “Nesta situação, várias características do porto deixaram de ter participação do Estado e passaram para a iniciativa privada”.
Nos dias de hoje, com o processo de modernização dos portos, foram inseridas outras instituições que são responsáveis pelo controle da mão de obra nos portos nacionais como, o Órgão de Gestão de Mão de Obra (OGMO) que controla o rodízio dos trabalhadores, a remuneração, o cumprimento das normas, a segurança e a saúde; e os Operadores Portuários: empresas privadas que realizam o embarque e o desembarque das cargas.
“Neste cenário, as instituições passaram a fazer algumas das atividades que os sindicatos dos trabalhadores exerciam, alterando o processo anterior e trazendo outras formas de controle e subordinação destes trabalhadores”, reforça.
Na produção portuária nacional, a modernização dos portos trouxe mudanças em termos de desregulamentação, privatização e liberalização, assim como na logística por meio da conteinerização das cargas, que demandou a introdução de novas tecnologias na movimentação dos portos nacionais.
Na avaliação do pesquisador, os resultados evidenciaram que houve aumento das áreas entregues a iniciativa privada; a perda do poder sindical (fragilização e fragmentação da categoria); alteração na forma de organização e distribuição do trabalho (notadamente a expressiva perda em termos de salários e quantidade de emprego); introdução de novas tecnologias; multifuncionalidade entre os trabalhadores portuários (reduzindo o quadro de trabalhadores, aumento da produção, mas com ampliação da exploração dos trabalhadores a favor dos lucros das empresas); precarização do trabalhador e implicações à saúde.
Para o professor e orientador da pesquisa, Marcelo Dornelis Carvalhal, da coordenadoria do curso de Geografia da Unesp de Ourinhos, em uma conjuntura marcada por profundas reformas trabalhistas e sindicais, sem que os trabalhadores sejam chamados à participação, a perspectiva da pesquisa investiga a diversidade de contratações no âmbito portuário e a compreensão de que tais trabalhadores são sujeitos de sua história, adaptando-se, por meio das formas de resistência, às ofensivas patronais.
Marco regulatório
As novas regras que regem o setor portuário desde 2013, trouxe mudanças em relação à forma de exploração dos portos, afetando as instalações, administração, operação e trabalho portuário.
Pela nova lei, os operadores portuários devem constituir em cada porto organizado um órgão gestor de mão de obra (OGMO) que será responsável por administrar o fornecimento do trabalhador portuário com vínculo empregatício permanente e do trabalhador portuário avulso.
O gestor responsável deverá estabelecer o número de vagas, a forma e a periodicidade para acesso ao registro do trabalhador portuário avulso, além de arrecadar e repassar aos beneficiários os valores devidos pelos operadores portuários: remuneração desse trabalhador e os encargos fiscais, sociais e previdenciários.
As seis categorias de trabalhadores portuários avulsos, entre eles o estivador, somente podem exercer a profissão se forem registrados/cadastrados no OGMO. No porto organizado, se o operador portuário necessitar de mão de obra avulsa deverá requisitar ao OGMO.
Estivador
O estivador é o trabalhador que exerce funções abordo dos navios. Entre algumas das suas atividades, ele pode atuar como contramestre-geral ou do navio, o que seria a maior autoridade da estiva a bordo; contramestre de terno ou de porão, aquele que dirige e orienta o serviço de estiva em cada porão de acordo com instruções; sinaleiro ou “portaló”, aquele que orienta o trabalho dos operadores de aparelho de guindar; e guincheiro, trabalhador habilitado a operar guindaste ou o motorista, que dirige o veículo quando esta é embarcada ou desembarcada.
(Fonte: Unesp)