Polêmica do uso do herbicida paraquat longe do fim

Polêmica do uso do herbicida paraquat longe do fim

Data: 19 de julho

O uso do paraquat nas lavouras brasileiras segue gerando debates acalorados. De um lado, especialistas defendem o herbicida como forma de manter economicamente viável a agricultura e argumentam que o produto não deixa resíduo na planta nem na terra. De outro, ações na Justiça pedem a proibição do agrotóxico, alegando seu grau de toxicidade e por ferir lei federal ao não possuir antídoto em caso de contaminação. Para completar, o uso é proibido em seu país de origem, a Inglaterra, e até na China, maior produtora mundial do produto.

No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) está em processo de reavaliação toxicológica do agrotóxico, trabalho que se arrasta desde 2008 e que não tem prazo para conclusão. Cabe à agência, em conjunto com o Ministério da Agricultura e o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), definir se o Brasil seguirá as decisões da China e da União Europeia ou se continuará permitindo a utilização em território nacional.

A expectativa era de que a Anvisa concluísse a análise à consulta pública e elaborasse nota técnica sobre o paraquat até maio de 2016. Mas não há novidade sobre o processo nem previsão para a conclusão do parecer (veja quadro), de acordo com informações da própria Anvisa, que não quis se manifestar sobre o tema.

Utilizado no combate a ervas daninhas e também para acelerar a maturação de culturas — o que é permitido de acordo com as atuais regras da Anvisa — , o produto é muito procurado pelos agricultores brasileiros. Conforme levantamento do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg), no ano de 2015 as culturas que tiveram maior uso de herbicidas — incluindo o paraquat — foram soja, cana, milho, algodão e trigo.

O tema gera dúvidas e ainda não há consenso. O paraquat prejudica a saúde do consumidor e do agricultor? Quais os danos causados ao meio ambiente? Vale a pena a utilização de um produto com alto grau de toxicidade? Qual o prejuízo econômico e agronômico com a eventual proibição?

Custos aumentam com a proibição

O professor de herbologia da Faculdade de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Aldo Merotto, considera que o impedimento do paraquat elevará o uso de outros herbicidas e, por consequência, aumentará o problema da resistência das plantas daninhas a esses agrotóxicos.

O argumento é defendido também no estudo Aspectos biológicos e econômicos do uso dos herbicidas à base de Paraquat no Brasil, atualizado em 2015, dos engenheiros agrônomos Robinson Osipe, professor de plantas daninhas da Universidade Norte do Paraná, e Fernando Storniolo Adegas, pesquisador da área de plantas daninhas da Embrapa Soja.

— A problemática do controle de plantas voluntárias também deve aumentar com a expansão das culturas resistentes aos herbicidas, principalmente ao glifosato — detalha Adegas.

Conforme a pesquisa, a retirada do paraquat do mercado agrícola brasileiro causaria aumento de cerca de R$ 400 milhões (130%) no custo dos produtores no manejo do plantio direto. O valor se refere à média de preços de outros agrotóxicos que poderiam ser utilizados em substituição ao paraquat, mas com períodos de ação e características diferentes.

Robson Barizon, agrônomo e pesquisador da Embrapa Meio Ambiente, reforça que o uso correto do herbicida, obedecendo às normas de segurança contidas na bula e embalagem do produto, não causa problemas. Além de não haver similar com a mesma eficácia, ele explica que os prováveis substitutos são mais caros.

Da plantação aos tribunais

No Rio Grande do Sul, a regulamentação do produto foi parar nos tribunais. O Estado tem uma legislação pioneira, elaborada com a participação do ambientalista José Lutzenberger, no ano de 1982. A Lei 7.747/82 veta o uso de substâncias proibidas no país de origem. Baseada na legislação, a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) indeferiu em 2012 o registro do paraquat no Rio Grande do Sul. Dois anos depois, uma ação movida por três fabricantes reverteu a decisão junto ao Tribunal de Justiça do Estado e liberou o uso do agrotóxico. Agora, a análise da medida, contestada por Fepam e Ministério Público, aguarda parecer do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Aldo Merotto afirma que o grande problema é a legislação vigente. Para ele, são necessárias medidas mais severas que regulamentem a aplicação dos agrotóxicos e fiscalização dessas ações:

— Não adianta proibir um produto, sendo que os demais outros 150 herbicidas continuarão a ser aplicados — diz.

Debate sobre riscos à saúde

Uma das alegações contrárias ao uso do paraquat é seu alto grau de toxicidade caso ingerido ou inalado. Dados do Centro de Informação Toxicológica (CIT) — vinculado à Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul — revelam que de janeiro de 2005 até julho de 2016 foram feitos 276 atendimentos por exposição ao paraquat no Estado, que resultaram em 52 mortes, sendo a maioria delas por consumo.

Considerando apenas 2014, foram 661 atendimentos por exposição a agrotóxicos – 26 por paraquat e 187 por glifosato. A diferença é que os casos de glifosato não geraram óbitos naquele ano e o contato com o paraquat foi responsável por três das cinco mortes por agrotóxicos. O coordenador do núcleo estatístico do CIT, Carlos Alberto Lessa, explica que a maioria dos problemas é causada pela falta de proteção no uso dos defensivos e pela ingestão proposital.

Em entrevista recente a Zero Hora, o ministro da Agricultura, Bairo Maggi, afirmou que nenhum produtor usa agroquímico porque gosta. Em relação ao paraquat, ele disse que o herbicida não é altamente tóxico na lavoura.

— é um produto que se ingerido mata as pessoas, e tem se utilizado esse produto em suicídio, no campo e na cidade — admite o ministro.

Saiba mais:

No Brasil, o paraquat é aplicado em culturas perenes, dessecação para colheita de culturas anuais e na dessecação de pré-semeadura no plantio direto, no combate a ervas daninhas e para acelerar a maturação das lavouras. No Rio Grande do Sul, o herbicida é utilizado em culturas como soja, milho, trigo e arroz.

Em 2015, a comercialização de herbicidas em todo o país totalizou US$ 3,08 milhões. No ranking dos estados que mais consomem estão Mato Grosso (23%), seguido pelo Rio Grande do Sul, Paraná e São Paulo, cada um com 13% do total, segundo o Sindiveg.

TOXICIDADE

Entre janeiro de 2005 e julho de 2016, foram 276 intoxicações por paraquat no Rio Grande do Sul. Do total, 52 resultaram em mortes.

PROCESSO DE REAVALIAçãO TOXICOLóGICA DE INGREDIENTES ATIVOS DO PARAQUAT

Etapas

1 — Publicação da reavaliação pela Anvisa, através de resolução da diretoria colegiada: ingrediente ativo e aspectos toxicológicos importantes (2008)

2 — Manifestação de interesse dos registrantes no ingrediente ativo e protocolados estudos toxicológicos

3 — Análise de estudos e elaboração da nota técnica pela Anvisa com apoio de instituição científica – Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)

4 — Consulta pública aprovada para manifestação da sociedade (2015)

5 — Análise das contribuições à consulta pública e elaboração de nota técnica final pela Anvisa (etapa atual)

6 — Discussão dos resultados pela comissão de reavaliação, composta pela agência, Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Ministério da Agricultura (sem prazo)

7 — Decisão final pela diretoria colegiada da Anvisa e publicação da resolução (sem prazo)

(Fonte: Zero Hora)

Por |2016-07-17T11:45:12-03:0017 de julho de 2016|Notícias|