Data: 27 de abril
Em 28 de setembro de 2015, o acordo do Benzeno completa 20 anos. Se na época de sua assinatura, o grande debate girava em torno da contaminação de trabalhadores em siderúrgicas, petroquímicas, indústrias químicas, refinarias de petróleo e usinas produtoras de álcool anidro, outras questões surgiram ao longo do tempo. Uma delas é a exposição dos frentistas em postos de gasolina, que tem mobilizado a criação de projetos de lei e a realização de audiências públicas.
“Não há limite de exposição segura ao benzeno. Isso tem que ficar muito claro. Não existe uma concentração abaixo da qual o risco é zero”, afirma a pesquisadora da Fundacentro/SP, Arline Arcuri. No caso dos frentistas, a exposição está descontrolada.
“Tanto nas empresas abrangidas pelo Acordo Benzeno como nos Postos de Combustíveis, onde o benzeno é apenas uma das substâncias tóxicas presentes no ambiente de trabalho, o que precisa avançar é o investimento em implantação de tecnologias de eliminação ou redução das emissões dos poluentes para o ambiente de trabalho e o ambiente geral, como já exigem a NR 20 e o próprio Acordo Benzeno. Esta é a forma de controle coletivo eficaz”, completa o tecnologista da Fundacentro/BA, Albertinho de Carvalho.
Audiências Públicas
Na Assembleia Legislativa de São Paulo, Arline Arcuri participou da audiência pública “O Benzeno e a Saúde do Trabalhador”, realizada em 27 de março. O Projeto de Lei 247/15, do deputado estadual Marcos Martins, proíbe que postos de combustíveis abasteçam os veículos após ser acionada a trava de segurança.
“Esta audiência pública teve uma importância muito grande, assim como outras lutas que travamos aqui de combate a produtos cancerígenos. Uma audiência significativa, com a mesa bem aproveitada”, avalia o deputado Marcos Martins, que fez o projeto após ser procurado por trabalhadores de Campinas.
Nessa cidade, o vereador Pedro Tourinho já havia desenvolvido um projeto de lei com esse mesmo teor, que foi tema de debate na Câmara Municipal em 16 de abril. Esse projeto de lei foi elaborado atendendo solicitação da Comissão Regional do Benzeno de Campinas e região, que é coordenada pela pesquisadora da Fundacentro Campinas, Elisabeth Trevisan. O evento contou com a participação das duas pesquisadoras da Fundacentro.
Já em Londrina/PR, Albertinho de Carvalho participou de uma audiência pública na Câmara Municipal em 15 de abril. Na ocasião, discutiu-se o Projeto de Lei 36/2015, do vereador Gustavo Richa, que também obriga os postos de combustíveis a abastecerem os veículos somente até o travamento automático de segurança.
“Somente através de mecanismos como estes, sejam no âmbito Municipal, como Estadual e, principalmente, Federal, é que as empresas são obrigadas a implantar instrumentos e práticas voltadas para a proteção da saúde dos trabalhadores e da própria população. Sem a obrigatoriedade estabelecida em Lei, inclusive com penalidades claramente definidas, os avanços, quando existem, são mínimos e totalmente dispersos”, reflete Carvalho.
Produto cancerígeno
O benzeno pode penetrar em nosso corpo pela pele e, principalmente, pela respiração, pois é volátil. Essa substância cancerígena age no sistema nervoso central. A intoxicação crônica pode causar desde a diminuição da quantidade das células do sangue até a ocorrência de anemia aplástica e leucemia.
O médico e auditor fiscal do trabalho Danilo Costa, que também participou da audiência em São Paulo, apontou a ocorrência de cinco casos de aplasia de medula e 14 de leucemia em trabalhadores de postos de combustíveis entre 2004 e 2006, registrados na Previdência Social.
“Em relação às doenças do benzeno, tivemos um período de movimentação social nos anos 80 em torno da leucopenia (diminuição de glóbulos brancos), um dos sinais da contaminação por benzeno. A partir da década de 90, não existe diagnóstico feito pelas empresas”, aponta o auditor da SRTE/SP (Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo). Ele cita o caso de uma empresa que nega a relação entre a ocorrência de leuceumia em trabalhadores e a exposição ao benzeno, mesmo havendo o produto no setor. “é uma violência”.
Albertinho de Carvalho chama atenção para o fato de que a cada 50 litros de gasolina abastecidos em um carro, há perda de 100 mililitros para a atmosfera. A gasolina pode conter até 1% em volume de benzeno. “é preciso investir em tecnologias de captação e recuperação dos vapores da gasolina e do benzeno, buscando o fechamento do ciclo do processo e a redução de perdas para a atmosfera e consequente contaminação das pessoas e ambientes”, explica o tecnologista.
Segundo Carvalho, existem tecnologias que recuperam mais de 95% dos vapores da gasolina que iriam para a atmosfera, tanto no processo de abastecimento dos veículos, como durante a transferência da gasolina dos caminhões tanques para os tanques subterrâneos dos postos. Esses recursos são utilizados nos Estados Unidos e na Europa há mais de 20 anos.
Outro problema é a transformação de Postos de Combustíveis em áreas de lazer e de consumo de alimentos. Já nas empresas abrangidas pelo Acordo Benzeno, houve avanços na vigilância à saúde e nas questões de monitoramento ambiental, principalmente na extinção do conceito de limite de tolerância para o benzeno, mas isso não é tudo.
“O benzeno é um cancerígeno humano confirmado e por isso tem que passar a ser obrigatório que as empresas adotem as melhores tecnologias existentes para a eliminação das emissões para a atmosfera. O sistema tem que ser o mais hermético possível. Não dá mais para aceitar a existência de equipamentos obsoletos ou não herméticos no processo e muito menos programas ditos de prevenção baseados na adoção de EPIs”, afirma Albertinho de Carvalho.
Segurança química em pauta
A segurança química também esteve em pauta no III Seminário – Curso de Especialização em Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, realizado em 27 de março, no Auditório da Escola Municipal de Saúde, em São Paulo. Em formato de programa de entrevista, o seminário fica acessível a 200 alunos que fazem o curso a distância e também foi transmitido ao vivo, pelo Canal Profissional da Rede São Paulo Saudável, disponível em 1000 TVs dentro de unidades de saúde, voltadas aos profissionais da área. Na ocasião, Arline Arcuri e Danilo Costa foram entrevistados pelo médico Sérgio Guerra Sartor, coordenador do núcleo de pós-graduação da Escola Municipal de Saúde.
Segundo Arline, há 90 milhões de substâncias químicas registradas, das quais 300 mil chegam ao mercado, dando origem a 90 milhões de misturas. “Há substâncias químicas que estão tão incorporadas à vida das pessoas que quando se descobre sua toxicidade, é tarde demais para retirá-la.” Seria preciso considerar isso antes, a partir dos princípios da Prevenção, quando se conhece a toxicidade e é preciso prevenir, e o da Precaução, quando se previne por não conhecer os riscos.
A pesquisadora da Fundacentro abordou o caso das nanotecnologias. O material na escala nanométrica tem mais possibilidade de entrar no corpo humano. As nanopartículas são usadas nos mais diferentes produtos: sapato, geladeira, embalagem de alimentos e produção de nanochips, entre outros.
“Indústrias produzem coisas novas, que são colocadas no mercado sem considerar o Princípio da Precaução. Você não sabe os riscos. Elas só conhecem os benefícios e há tendência de minimizar o risco. Usar o Princípio da Precaução não significa proibir, mas ter precaução no uso, considerando todo o ciclo de vida do produto e a minimização do risco. Por exemplo, trabalhar com o material enclausurado”, considera Arline Arcuri.
Fonte: Fundacentro