Fatos portadores do futuro – Lógica da logística reversa

Fatos portadores do futuro – Lógica da logística reversa

Data: 7 de novembro

René Mendes*

Já é relativamente bem conhecido que, com o advento da Lei no 12.205/2010 (regulamentada pelo Decreto no 7.404/2010), o Brasil passou a ter uma avançada política pública de resíduos sólidos, que, entre suas múltiplas estratégias, inclui o conceito de ‘ciclo de vida do produto’, definido como uma série de etapas que envolvem o desenvolvimento do produto, a obtenção de matérias-primas e insumos, o processo produtivo, o consumo e a disposição final.

Quanto à disposição final, a lei estabeleceu uma lista de produtos em que são necessárias, por parte dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, a estruturação e a implementação de sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana de resíduos sólidos. Logística reversa é conceituada na lei como “um instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada”. A própria lei já incluiu os agrotóxicos (resíduos e embalagens); pilhas e baterias; pneus; óleos lubrificantes e seus resíduos e embalagens, lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e luz mista, além de produtos eletroeletrônicos e seus componentes.

Se fatos portadores de futuro se caracterizam por “sinais ínfimos, por sua dimensão presente, existentes no ambiente, mas imensos por suas consequências e potencialidades” (Michel Godet), considero que o tema da logística reversa constitui um vistoso prato cheio. Cheio de fatos portadores de futuro. A começar pelo entendimento de que a operacionalização da logística reversa reúne e consolida um conjunto de conceitos e princípios muito caros e preciosos para políticas ambientais e de sustentabilidade, tais como a prevenção e precaução; o princípio do poluidor-pagador e do protetor-recebedor; o princípio da “ecoeficiência”; o da cooperação entre as diferentes esferas do poder público, o setor empresarial e demais segmentos da sociedade; o da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, e o reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania, entre outros.

Por si só, o fato de conceitos como esses tornarem-se práticas correntes em nosso país, já é portador de alvissareiro futuro, merecedor de ser reconhecido e saudado.

Porém, para os que militam no campo da Saúde e Segurança dos Trabalhadores, robustece-se a esperança – aquela que sempre é a primeira a nascer e a que nunca morre – posto que a maioria das questões ambientais é profundamente imbricada com as questões “ocupacionais”, mormente no tocante aos perigos e riscos químicos, físicos e biológicos. Daí a razão de considerarmos a adoção da logística reversa como um fato, também, portador de futuro para a saúde e segurança dos trabalhadores. Com efeito, se de um lado, criam-se, eventualmente, novos perigos e riscos, na medida em que “cadeias de produção”, lineares e unidirecionais, transformam-se em “ciclos”, mais ampliados e complexos, por outro, criam-se novas oportunidades de trabalho, bem como a possibilidade de melhores condições de acesso à informação e ao controle social para trabalhadores e trabalhadoras atraídos para atividades do “ciclo de vida”, que ou não existiam, ou não eram valorizadas. São momentos e lugares preciosos para o desenvolvimento do trabalho seguro e saudável!

Pois bem: a boa notícia é que novos acordos setoriais de logística reversa estão sendo aprovados pelo Comitê Orientador para a Implantação de Logística Reversa (CORI), composto por representantes do Ministério do Meio Ambiente, Saúde, Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Agricultura e Abastecimento e Fazenda. Os mais recentes são os referentes aos setores de lâmpadas e de embalagens em geral. Entre os acordos setoriais atualmente em discussão, destacam-se – entre outros – o de resíduos de medicamentos e suas embalagens.

Como se vê, temos bons motivos para antever a melhoria das condições de saúde e segurança dos trabalhadores brasileiros, ancorada, porém, em referências conceituais e legais mais avançadas, oriundas dos princípios da Sustentabilidade econômica, social e ambiental. Um bem vindo a este “upgrade”!

*René Mendes – Médico especialista em Saúde Pública e em Medicina do Trabalho. Professor Titular da Faculdade de Medicina da UFMG (aposentado). Diretor da René Mendes Consultoria. renemendes@renemendes.com.br

Fonte: Revista Proteção

Por |2014-11-07T10:36:52-02:007 de novembro de 2014|Notícias|