Data: 24 de março
O trabalho em frigoríficos tem despertado a atenção dos operadores do Direito do Trabalho, tendo em vista as graves condições em que é desenvolvido. Com efeito, os trabalhadores ficam expostos a diversos riscos à saúde, como o frio, os movimentos repetitivos em curto espaço de tempo, o uso de ferramentas cortantes, a pressão psicológica por produtividade, entre outros fatores que, conjugados, tornam extremamente penoso este meio ambiente de trabalho.
A preocupação não é só teórica. Ao contrário, a prática demonstra o número alarmante de afastamentos, mediante concessão de benefícios previdenciários, de trabalhadores que laboram em frigoríficos, sobretudo em razão de doenças como LER/DORT, bem como em decorrência de acidentes típicos de trabalho, a exemplo de amputações em partes do corpo.
Nesse sentido, Heiler Ivens de Souza Natali e Sandro Eduardo Sardá (2012, p. 159) advertem que, nos frigoríficos, “a sobrecarga muscular reside na imposição de um ritmo de trabalho absolutamente incompatível com a condição humana”.
Diante desse grave quadro, instituições como o Ministério Público do Trabalho (MPT), o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e organizações não governamentais (ONG’s) vêm desenvolvendo estudos e projetos visando analisar as adversidades deste meio ambiente de trabalho e buscar soluções, junto aos empregadores, para minimizar o impacto gerado na saúde do trabalhador.
Nesse contexto, cabe citar a evolução da jurisprudência, hoje consubstanciada na súmula 438 do TST, reconhecendo que o empregado submetido a trabalho contínuo em ambiente artificialmente frio, nos termos do parágrafo único do art. 253 da CLT, ainda que não labore em câmara frigorífica, tem direito ao intervalo intrajornada previsto no caput do art. 253 da CLT.
Conforme está expresso na supracitada súmula, este intervalo de 20 minutos a cada 1 (uma) hora e 40 (quarenta) minutos só está assegurado àqueles que trabalham em ambiente artificialmente frio, o que é definido no parágrafo único do art. 253 e no item 36.13.1.1 da NR (norma regulamentadora) nº 36 do Ministério do Trabalho e Emprego. Assim, fazem jus a este intervalo apenas os trabalhadores que exercem atividades em temperaturas menores que 15ºC, 12ºC ou 10ºC, conforme zona climática do mapa oficial do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Contudo, é inequívoco que os demais trabalhadores que exercem atividades em frigoríficos, ainda que não laborem em ambiente artificialmente frio, estão também submetidos a condições muito gravosas à saúde, em razão das particularidades deste meio ambiente de trabalho, já descritas supra.
Em virtude disso e com amparo no art. 200 da CLT, o MTE editou a NR 36, específica para o trabalho em frigoríficos, estabelecendo, no item 36.13.2 que, para os trabalhadores que desenvolvem atividades exercidas diretamente no processo produtivo, ou seja, desde a recepção até a expedição, onde são exigidas repetitividade e/ou sobrecarga muscular estática ou dinâmica do pescoço, ombros, dorso e membros superiores e inferiores, devem ser asseguradas pausas psicofisiológicas de, no mínimo, 20, 45 ou 60 minutos, conforme seja a jornada, respectivamente, de 6h, 7h20 ou 8h48.
A norma estabelece ainda tempos de tolerância para a aplicação da pausa e que os períodos unitários de pausas devem ser de no mínimo 10 e no máximo 20 minutos (item 36.13.2.5). Por outro lado, no item 36.13.2.3.1 está expresso que, sendo a jornada superior a 9h58, há direito a pausa de 10 minutos a cada 50 minutos de trabalho.
Em síntese, os trabalhadores de frigoríficos têm direito ao intervalo do art. 253 da CLT se trabalharem em ambiente artificialmente frio, nos termos do parágrafo único do dispositivo e item 36.13.1.1 da NR 36. Caso não se enquadrem em tal condição, têm direito às pausas remuneradas previstas no item 36.13.2 da mesma Norma Regulamentadora do Ministério do Trabalho e Emprego.
Por fim, cumpre dizer que a supracitada NR 36, recentemente editada, vem ao encontro dos anseios daqueles que se preocupam com as gravosas condições de trabalho em frigoríficos. Registre-se, inclusive, que é bem-vinda a previsão da NR 36 para que haja rodízio de funções, como forma de minimizar os riscos para a saúde destes trabalhadores, que executam tarefas muito repetitivas em curto espaço de tempo e, por isso mesmo, extremamente desgastantes.
Contudo, a previsão desta NR ainda parece tímida e insuficiente, pois inicia prevendo intervalo de apenas 20 minutos para uma jornada diária de 6 horas. Melhor seria se fosse estabelecida uma pausa de 10 minutos para cada 50 minutos trabalhados, independentemente da jornada diária, tal como prevê, para os digitadores, o item 17.6.4, “d” da NR 17, que trata de ergonomia. Isso porque a atividade em frigoríficos parece ser tão ou mais gravosa para a saúde, especialmente dos membros superiores de cada indivíduo, se comparada à dos digitadores. Nesse sentido, vale lembrar que a saúde é direito de todos (art. 6º, CF/88) e que o empregador deve visar a redução dos riscos inerentes ao trabalho (art. 7º, XXII, da CF/88), o que é também objetivo da OIT, conforme Convenção 161, ratificada pelo Brasil.
Fonte: Revista Proteção